UERJ (julho) 2007 – Questão 1

Linguagens / Português
Entre as folhas do verde O1
 
(...) O príncipe acordou contente. Era dia de caçada. Os cachorros latiam no pátio do castelo. (...)
Lá embaixo parecia uma festa. (...) Brilhavam os dentes abertos em risadas, as armas, as trompas que deram o sinal de partida.
Na floresta também ouviram a trompa e o alarido. (...) E  cada um se escondeu como pôde. Só a moça não se escondeu. Acordou com o som da tropa, e estava debruçada no regato quando os caçadores chegaram.
Foi assim que o príncipe a viu. Metade mulher, metade corça, bebendo no regato. A mulher tão linda. A corça tão ágil. A mulher ele queria amar, a corça ele queria matar. Se chegasse perto será que ela fugia? Mexeu num galho, ela levantou a cabeça ouvindo. Então o príncipe botou a flecha no arco, retesou a corda, atirou bem na pata direita. E quando a corça-mulher dobrou os joelhos tentando arrancar a flecha, ele correu e a segurou, chamando homens e cães.
Levaram a corça para o castelo. Veio o médico, trataram do ferimento. Puseram a corça num quarto de porta trancada.
Todos os dias o príncipe ia visitá-la. Só ele tinha a chave. E cada vez se apaixonava mais. Mas corça-mulher só falava a língua da floresta e o príncipe só sabia ouvir a língua do palácio.
Então ficavam horas se olhando calados, com tanta coisa para dizer.
Ele queria dizer que a amava tanto, que queria casar com ela e tê-la para sempre no castelo, que a cobriria de roupas e joias, que chamaria o melhor feiticeiro do reino para fazê-la virar toda mulher.
Ela queria dizer que o amava tanto, que queria casar com ele e levá-lo para a floresta, que lhe ensinaria a gostar dos pássaros e das flores e que pediria à Rainha das Corças para dar-lhe quatro patas ágeis e um belo pelo castanho.
Mas o príncipe tinha a chave da porta. E ela não tinha o segredo da palavra.
(...) E no dia em que a primeira lágrima rolou dos olhos dela, o príncipe pensou ter entendido e mandou chamar o feiticeiro. Quando a corça acordou, já não era mais corça. Duas pernas só e compridas, um corpo branco. Tentou levantar, não conseguiu. O príncipe lhe deu a mão. Vieram as costureiras e a cobriram de roupas. Vieram os joalheiros e a cobriram de joias. (...) Só não tinha a palavra. E o desejo de ser mulher.
Sete dias ela levou para aprender sete passos. E na manhã do oitavo dia, quando acordou e viu a porta aberta, juntou sete passos e mais sete, atravessou o corredor, desceu a escada, cruzou o pátio e correu para a floresta à procura da sua Rainha.
O sol ainda brilhava quando a corça saiu da floresta, só corça, não mais mulher. E se pôs a pastar sob as janelas do palácio.
(COLASANTI, Marina. Uma idéia toda azul. São Paulo: Global, 1999.)
1 Título retirado de um verso de uma canção popular da Idade Média.
No texto de Marina Colasanti, a necessidade de autopreservação da corça-mulher está associada ao sacrifício.
Essa convergência se expressa na seguinte passagem:
a) “E quando a corça-mulher dobrou os joelhos tentando arrancar a flecha, ele correu e a segurou, chamando homens e cães.”
b) “Todos os dias o príncipe ia visitá-la. Só ele tinha a chave. E cada vez se apaixonava mais.”
c) “Ela queria dizer que o amava tanto, que queria casar com ele e levá-lo para a floresta,”
d) “O sol ainda brilhava quando a corça saiu da floresta, só corça, não mais mulher. E se pôs a pastar sob as janelas do palácio.”

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